quinta-feira, julho 16, 2009

Uma história de chegadas


Maria Nostálgica

Parte II


Ainda à Íris...

PAUSA PARA CAFÉ

Até a Maria nostálgica, a insignificante empregada do bar das partidas, um pontinho minúsculo na imensidão de pessoas, bagagens, pistas e aviões, precisava às vezes de um café. Sobretudo quando a sua imensa tristeza a assolava e desolava. Aquela vida, todos os dias, a acorrentar-lhe os pés à terra…
A colega dela, Madalena, que nesse momento descansava em casa o cansaço do turno da noite, já notava a tristeza da Maria havia meses. Nesse dia (talvez por eu estar a contar esta história), tomou uma decisão antes de adormecer ao som daqueles ruídos de aviões a chegar e a partir, ruídos que a perseguiam até casa, impregnados na memória de um cérebro cansado.
Tomou uma decisão, dizia eu:
Amanhã, quando encontrar a Maria, vou agarrar coragem e perguntar-lhe o porquê de tanta tristeza. Ela tem tudo o que eu desejava ter e não tenho. E de nós as duas, a triste é ela! Eu é que devia andar infeliz, ela não… amanhã vou-lhe perguntar. Não passa de amanhã.
Não vou aqui reproduzir o diálogo das duas – há que ter um mínimo de decoro nesta vida de contar histórias. E já basta a vida da Maria que eu devassei para vos explicar a tristeza dela.
Posso, no entanto, resumir o que as duas disseram uma à outra…
A Maria contou a tristeza de ser sempre a que fica, apesar de ironicamente, ser a que mais queria ir. Madalena, ao princípio, deixou-a falar na correcta e sensata atitude de quem ouve um desabafo. Quando a Maria terminou, ainda fez uma tímida tentativa de lhe lembrar filhos, marido, casa, jardim, cão… mas até ela pressentia que a realidade não era feita da mesma matéria que os sonhos.
E era um sonho o que pairava no olhar de Maria, enquanto viajava pelos destinos escritos em letras luminosas do painel informativo no átrio do aeroporto.
De repente, Madalena sorriu: uma ideia tinha-se iluminado dentro dela.
Despediu-se apressadamente da colega e dizendo-lhe que tinha de ir para casa, esgueirou-se pela porta que dava acesso à administração do aeroporto.
E esta história termina aqui.
Passados poucos dias, Maria foi transferida para outro bar, o das chegadas. Lá assistiu vezes sem conta à alegria de quem regressava ao país do sol.
E foi no bar das chegadas que percebeu que, afinal, a sua realidade era o sonho daquelas pessoas que vinham de longe, em busca do calor da Pátria

Claro que um dia viajou com o seu marido. Mas isso é outra história.

Margarida Neves
Benavente, 1 de Julho de 2009

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