segunda-feira, julho 06, 2009

Uma História de partidas


Maria Nostálgica

À minha amiga Íris, que me sugeriu o final desta história


Esta história fala de uma mulher já mencionada no meu texto anterior, Pequenas coincidências… trata-se da senhora que estava no bar das partidas, no aeroporto de Lisboa, quando me apareceu o meu vizinho trambiqueiro.
Esta senhora, chamemos-lhe Maria Nostálgica, à semelhança daquele primor de desconstrução do Chico Buarque, no poema Construção, vivia imersa e sufocada na sua rotina.

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único…

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico…


Assim era a vida da Maria nostálgica. Tudo sempre igual, tudo com sabor a requentado, nada de novo, nada de excitante, nenhuma pincelada de cor na sua vida tão cinzenta.
Gostava do marido, claro. Amava os filhos, óbvio. Tinham dinheiro para viver, tinham saúde…tinham uma casinha aconchegada num bairro solarengo, plantas, um cão…
Sejamos francos: Maria nostálgica era medianamente feliz, dentro da rotina que não a deixava sonhar além-fronteiras.
O despertador arranca-a da letargia do sono. Duche, roupa escolhida de véspera, beijo apressado no marido e nos filhos adormecidos e viagem até ao aeroporto, ao som das vozes sorridentes da Carla Rocha e do Zé Coimbra no Café da Manhã da RFM.
Trabalha por turnos, esta é a semana de entrar às 7h00 – estaciona o carro no parque dos funcionários do aeroporto e dá entrada no bar das partidas, substituindo a colega Madalena, que nessa semana tinha o turno da noite.
A sua vida era aquela: servir cafés e bolinhos às pessoas que iam sair do país. Servia o último café de aroma nacional a passageiros que iam voar para longe. Ouvia conversas, conversas de excitação de quem ia viajar, lamúrias de despedidas de quem deixava amigos e família. O ambiente daquele bar era povoado de conversas em várias línguas e diferentes tons. Enquanto tomavam o seu café ao balcão, homens de fatos irrepreensíveis ultimavam ao telemóvel detalhes das suas viagens de negócios.
Depois, cada um chamado pelo relógio, afastava-se arrastando atrás de si as bagagens e deixando o bar deserto e uma Maria Nostálgica, olhos rasos de lágrimas e num desejo de tudo largar e partir também.
Triste ironia esta de tanto querer conhecer mundo e desse aroma exótico apenas sentir o entusiasmo de quem estava para partir.
Era esse o drama de Maria Nostálgica Era essa a sua dor.

PAUSA PARA CAFÉ
Continua...
DESAFIO:
Alguém tem uma sugestão para o final desta história?

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